"Coletivos se apropriam da poesia como instrumento de denúncia e resistência cultural e política"
O Slam pode ser compreendido como um fenômeno social, cultural e artístico que reúne
juventude, poesia autoral e performance em competições ou “batalhas” poéticas que têm se propagado pelo Brasil nos últimos onze anos. As rodas de poesia são frequentadas por um público jovem e protagonizadas por slammers (como são denominados os poetas do Slam) que ocupam ruas, praças e pontos de cultura para apresentar poesias que versam sobre temas de seu cotidiano e da atualidade. No repertório são recorrentes temas como: racismo, feminismo, violência, machismo, drogas, desigualdade social, sexualidade, relações familiares, relacionamentos, entre outros.
O que é Slam?
O slam é uma competição de poesia falada criada nos Estados Unidos por Marc Smith, operário da construção civil e poeta, mais especificamente em Chicago em 1986 e trazido ao Brasil em 2008 por Roberta Estrela D’Alva.
Originário do inglês, o termo slam quer dizer batida. Algo semelhante a uma pancada. No entanto, resumir essa palavra a apenas um significado é uma tarefa difícil porque qualquer descrição que se faça nunca dará conta da amplitude que essa vertente da cultura urbana alcançou nem do impacto que ela tem na vida de inúmeras pessoas.
As batalhas de poesia falada seguem algumas regras: poesias autorais de até três minutos sem a utilização de objetos cênicos e sem acompanhamento musical. Corpo e voz são elementos fundamentais! As notas são dadas por um júri popular escolhido no momento da competição. Esta normalmente ocorre em três fases: geral, semifinal e a final, que revela o poeta vencedor daquela edição.
Num slam são recitadas poesias de temas livres, mas verifica-se, ao longo do tempo, que grupos historicamente excluídos vêm se utilizando dessa expressão artística como forma de reivindicar seus lugares de direito, de dar visibilidade às suas lutas e se colocar como protagonistas de suas próprias histórias.
Slam no Brasil: um breve histórico
A chegada no Brasil foi em 2008 pela Roberta Estrela D’alva a partir da criação do ZAP! (Zona Autônoma da Palavra), realizado na então sede do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos Teatro Hip-Hop, no bairro da Pompeia, em São Paulo, demolido em 2014 pelas consequências da especulação imobiliária paulista. Isso não impediu, no entanto, que o ZAP! continuasse a ser realizado.
Em 2011, Roberta Estrela D’alva representou o Brasil na Copa do Mundo de Slam em Paris, na França, por meio de seleção por vídeos e materiais enviados à organização do campeonato mundial. Em 2012, Fabio Boca, campeão do ZAP! em 2011, representou o Brasil em Paris. Em 2012 e em 2013, passou a haver um Campeonato Estadual em São Paulo (Slam SP) por conta do aumento da quantidade de slams no estado. Em 2012, quem venceu foi Lews Barbosa e em 2013, Emerson Alcalde, co-fundador do Slam da Guilhermina, o primeiro slam do Brasil a ser realizado na rua. Dessa forma, ambos foram para a Copa do Mundo de Slam em 2013 e em 2014, respectivamente.
Em 2014, por conta do surgimento de slams em outros estados, como Rio de Janeiro e Minas Gerais, o Núcleo Bartolomeu de Depoimentos criou o Slam BR e, quando os estados passaram a ter seus campeonatos estaduais, passou a funcionar assim: cada estado realiza seus slams que classificam poetas para os campeonatos estaduais locais; dos campeonatos estaduais sai um ou mais poetas classificados para o Slam BR. Quem vence o Slam BR representa o Brasil na Copa do Mundo de Poesia Falada, realizada na França. O primeiro campeão do Slam BR, em 2014, foi mineiro João Paiva, e em 2015 foi a vez do poeta paulista Lucas Afonso; ambos representaram o Brasil na França em 2015 e em 2016, respectivamente. 2016 e 2017 foram anos de destaque das mulheres no Slam BR: Luz Ribeiro, de São Paulo (2016) e Bell Puã, de Pernambuco (2017) levaram o título de campeãs nacionais de poesia falada e representaram o Brasil na França.
Até o momento, o Slam BR é realizado em São Paulo por ser organizado pelo Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, que não só organiza o evento como arca com despesas de passagem e estadia para poetas e também com gastos relacionados à viagem do vencedor do Campeonato Brasileiro para a Copa do Mundo de Poesia Falada.
Como é possível notar, o crescimento do slam no Brasil não parou desde a sua chegada em 2008 e o Slam BR de 2018 foi mais que especial por comemorar os 10 anos da chegada do slam em terras canarinhas. As minorias foram completamente conquistadas pela cultura do slam e sem dúvida esses eventos auxiliam no processo de democratização da poesia e possuem, hoje, uma posição central na ampliação da representatividade das comunidades marginalizadas no cenário poético mundial.
Slam e negritude
Onde está o povo preto? Que lugares ainda ocupa de forma majoritária na sociedade brasileira? Que soluções podemos traçar como forma de combater o racismo numa sociedade que finge não enxergá-lo? Qual o papel da cultura nesse contexto?
No contexto de um Brasil em que o povo preto sofre até os dias atuais com as consequências da escravidão e de uma falsa Abolição, que não lhe deu as devidas reparações, o slam vem se configurando como uma forma de arte que questiona as estruturas vigentes e propõe novos formatos para a sociedade, de forma contínua.
A continuidade das ações é um fator importante a ser ressaltado, tendo em vista que, com a proximidade do dia 20 de novembro, estão sendo resgatadas diversas discussões sobre a questão racial.
Num país onde o racismo é arraigado em todas as suas estruturas, esse resgate é necessário, porém é insuficiente porque não dá conta da realidade que é a seguinte: para os negros, essas questões permeiam toda a sua existência e não apenas o mês de novembro. Fica a reflexão.
O Slam chega ao RS através das minas
Slam Chamego - Foto Josemar Afrovulto
O primeiro slam do Rio Grande do Sul aconteceu no dia 17 de dezembro de 2016 na
Praça da Matriz, em Porto Alegre. O encontro foi realizado pelo primeiro grupo de slam gaúcho, o Slam das Minas RS, formado exclusivamente por mulheres e assumidamente inspirado pelo Slam das Minas de São Paulo e Distrito Federal. Em entrevista15, Daniela Alves (conhecida como Dany Alves), conta que conheceu o Slam no final de 2015 através das redes sociais. Conforme o relato de uma das precursoras do Slam no RS, o objetivo inicial era promover uma batalha de rap e a ideia de inserir o Slam surgiu como uma possibilidade para as meninas que não sabiam ou não queriam fazer freestyle18, mas que tinham poesias guardadas e, assim, também poderiam participar do encontro. A partir disso, Daniela e Vanessa pesquisaram sobre o Slam na internet, conheceram as regras básicas de funcionamento, passaram a acompanhar o Slam das Minas SP e o Slam das Minas de Brasília e então tiveram a ideia de fundar o Slam das Minas RS.
Na sequência do Slam das Minas RS, outros slams surgiram. Os mais antigos e sólidos
são Slam RS, Slam Peleia e Slam Chamego. Além desses quatro slams que emergem com mais destaque por serem os mais populares e consolidados, a partir de um levantamento provisório e inicial, é possível apontar também a existência de mais 14 grupos em Porto Alegre e Região Metropolitana, sendo eles: Slam do Trago (que acontece no Bar da Carla, em Porto Alegre), Slam do Sopapo (grupo Sopapo Poético), Slam da Tinga (bairro Restinga), Slam da Bonja (bairro Bom Jesus), Slam Crânio (Canoas), Slam Matriz (Viamão), Vale das Minas (exclusivamente de mulheres - São Leopoldo), Slam Novo Hamburgo, Slam de Maria
(exclusivamente de mulheres - em Esteio), Slam Liberta (Esteio), Slam 48 (Alvorada), Slam do Gozo (sobre sexualidade, erotismo), Slam da Beira (Porto Alegre), Slam Poetas Vivos (do
coletivo homônimo). No interior do Rio Grande do Sul existem alguns grupos como o Slam da Montanha (de Caxias do Sul), o Slam Poesia e o Slam das Minas (de Pelotas).
Slam do Vida
Um novo slam nasce neste próximo dia 30 de julho às 14h na sede da Alvo Cultural, serão 4 edições onde se premiará o vencedor com R$1200,00. Além das batalhas poéticas teremos show de Agnes Mariá, discotecagem da Plaza Gangsta CO. e apresentação de DKG, intervenções culturais, feira de produtos independentes e muito mais.
Como Participar?
As inscrições serão gratuitas no local do evento e sempre no dia em que acontecerão as etapas. O limite de inscrições máximo de 8 poetas inscritos por etapa.
Referências:
Artigo MOVIMENTO SLAM NO BRASIL E NO RS: ORIGENS, CARACTERÍSTICAS E
DINÂMICAS DAS BATALHAS POÉTICAS DE JUVENTUDE de autoria de
Liége Barbosa (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
Site SLAM BR
Wikipedia
Site Brasil de Fato
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